Já passou um bocado de tempo desde o dia em que minhas aspirações futuras seriam moldadas para se tornarem o maior sonho da minha vida. Olhando pra trás, há 10 anos, ainda posso me imaginar naquele avião tentando me livrar do Carnaval brasileiro (Por que eu faria isso? Às vezes me pergunto...); minha alma inquieta buscava uma jornada tão nova quanto instigante para me conduzir ao desconhecido. Isso foi em março de 2011, quando visitei Amsterdã pela primeira vez. Embora pareça um clichê, foi amor à primeira vista. Loucamente.

Preciso ser clara desde o início: fumar maconha nunca foi o principal motivo para conhecer Amsterdã. Eu até nutria uma vontade de provar outros dos seus estereótipos, como o famoso queijo Gouda e o passeio pelos campos repletos de tulipas (algo que nos tira o fôlego). Afinal, você merece experimentar ambas experiências ao menos uma vez na vida!

No entanto, para esclarecer o equívoco de que Amsterdã significa cannabis, prostituição ou flores, me vi compelida a relevar uma cidade que poucos sabiam existir: dinâmica, mas não excessiva, organizada embora não entediante, cheia de museus maravilhosos, parques, escolas, cafés, hotéis, lojas e tanto mais. Ela também carrega um ar cosmopolita assegurado por uma considerável população de expatriados que, na minha opinião, é a chave para um lugar democrático e vibrante. Todos os anos, cerca de 40 mil emigrantes vêm da Inglaterra, seguidos de América, Índia e Alemanha. É uma cidade magnética a nível internacional.

Uma capital com cerca de 873 mil cidadãos, que dá as boas-vindas ao futuro, Amsterdã estimula liberdade, criatividade e qualidade de vida. Alguns fatos falam por si: há mais bicicletas que moradores e 60% deles pedala diariamente; o festival Gay Pride, realizado em agosto, é muito apreciado e prova que direito de escolha e respeito estão no cerne da sociedade holandesa; muitas empresas multinacionais de sucesso estabelecem suas sedes aqui (por exemplo, Booking.com, Tesla, Calvin Klein, Netflix), onde encontram um ambiente de negócios aberto, enriquecido por impostos corporativos baixos e trabalhadores multilíngues altamente qualificados. É um lugar extraordinário por si só! Não à toa que me apaixonei instantaneamente por tudo isso.

Águas profundas

Concordo que virtudes sedutoras podem ser encontradas por toda parte em Amsterdã. Posso dar-lhes mais um motivo que faz este lugar se destacar. Pense nos 165 canais pitorescos tomados por 2.500 casas flutuantes, cujos proprietários de espírito livre têm um estilo de vida tão distinto. Um importante elemento histórico, o Canal Ring (Grachtengordel), foi reconhecido pela UNESCO em 2010 como um monumento mundialmente aclamado. Eu os acho ainda mais deslumbrantes à noite.

Apesar de tantos elogios maravilhosos, as condições climáticas são definitivamente deprimentes. Se você vem de um país tropical, como eu, a ausência de sol te coloca pra baixo. Eu nunca tinha percebido como seria difícil até passar por um inverno inteiro na Holanda: foram dias de tanta luta que pensei que estava ficando deprimida. Talvez fiquei. Não havia vitamina D, chá de gengibre ou sauna suficientemente capazes de levantar meu espírito. Inquestionavelmente, a pandemia agravou esse período amargo.

Além disso, semanas congelantes sem cessar são realmente desagradáveis e o fato de que a linda bola de fogo no céu está em qualquer lugar, menos aqui, bem, para mim, esta é uma das piores privações que alguém pode sentir. É por isso que quando os raios de sol tão necessários aparecem, a cidade se ilumina e floresce e se transforma em um país das maravilhas. Não podemos nos conter e dominamos os parques e canais vestindo o mínimo de roupa possível acompanhados de uma cerveja gelada e estimulante. É uma sensação sublime!

Campo escorregadio

Não vou mentir que acho bem peculiar - pra não dizer interessante - viver em uma cidade onde algumas de suas marcas registradas são as ruas que cheiram a maconha fartas de profissionais do sexo atrás de janelas vermelhas constantemente observadas por multidões de mochileiros embriagados. Mesmo que eu nunca vá lá, exceto quando o Covid-19 dispersou a multidão enlouquecida, este é um dos Centros mais autênticos do mundo.

No entanto, um tema problemático governa no coração da essência mais icônica de Amsterdã: a tentativa de controlar o tráfico de drogas e a proibição do acesso de turistas a coffeeshops. Sou a favor de uma regulamentação efetiva em cima de atividades ilícitas que cria danos e perigos em tantas esferas (isso não quer dizer que eu seja a favor de proibir turistas fumarem maconha). No entanto, acredito firmemente que se os visitantes se tornarem persona non grata nesses locais de busca ao nirvana, a cidade precisa desesperadamente renovar sua propaganda global.

Sejamos francos: nas últimas décadas, maconha, queijo e tulipas foram os únicos temas sobre a cidade que viajaram pelo boca a boca ao redor do mundo todo. Na verdade, o museu de Anne Frank também. Embora não seja fácil mudar uma reputação de longa data, sou confiante de que os responsáveis pelo marketing da cidade têm grandes ativos em suas mãos. Afinal, Amsterdã é um deleite para os amantes de arquitetura, gastronomia, arte e música.

O que fazer em Amsterdã, afinal? Bom, como sempre me senti motivada a mostrar as maravilhas da minha querida cidade para amigos e familiares, além dos pré-conceitos acima mencionados, começo por compartilhar as qualidades e lugares que considero imperdíveis:

Arquitetura

Os encantos da capital holandesa vão muito além de canais, pontes, moinhos de vento e casas de tijolos vermelhas ou pintadas de preto. Vale a pena ver tudo isso; muitas vezes, eu diria. Mas há toneladas de outras joias inesperadas que fazem parte do planejamento urbano da cidade e raramente são mencionadas nos guias de viagem comuns.

Tomemos, por exemplo, as Docklands Orientais (Oostelijk Havengebied). É uma mistura fotogênica de distritos, ilhas e penínsulas às margens do rio IJ que já serviu de porto. As consequências da Segunda Guerra Mundial, no entanto, deixaram-no como um bairro abandonado cujos edifícios e armazéns foram demolidos pela cidade ou ocupados por artistas e semelhantes. Foi apenas na década de 80 que uma manobra inteligente entrou em vigor para preservar esse apêndice histórico. Arquitetos estrangeiros inventivos foram contratados para criar estilos inovadores, funcionais e excêntricos que até hoje distinguem os edifícios da área. Assim que você chegar lá, se sentirá em uma nova Amsterdã.

Talvez não passe pela cabeça de todas as pessoas que Amsterdã tem uma herança Art Déco afortunada. De cinema, museu e sauna a cafés, restaurantes e hotéis, esses lugares revelam histórias maravilhosas e despercebidas. Alguns dos exemplos mais esplendorosos são o Café Schiller, o restaurante do American Hotel, o The Movies (uma casa de cinema veterana) e o Tuschinski Theatre que comemora seu centenário em 2021. Marlene Dietrich e Edith Piaf foram alguns de seus artistas mais ilustres.

Cultura e Arte

Diversidade, liberalismo e pragmatismo desempenham papéis importantes na vida cotidiana dos holandeses. Os séculos de atividades mercantis e exploratórias também formaram grande parte da mentalidade do país, juntamente com muitas influências estrangeiras. É um caldeirão de culturas e costumes que corre principalmente nas veias da capital.

A vida cultural é variada e inspiradora. A cidade realiza festas extraordinárias e festivais de música; dificilmente escolheria os melhores, embora prefira o Milkshake Festival, a Parada Gay e o Dia do Rei. No entanto, Nederland e Dekmantel também são referências que valem a pena assistir se você curtir a cena eletrônica.

Já para quem procura arte, não é segredo que alguns dos museus mais aplaudidos e visitados do mundo estão localizados nesta capital. Eu tenho meus favoritos (como por exemplo o Rijksmuseum Amsterdam ou o Van Gogh Museum Amsterdam) onde as obras marcantes de Van Gogh são celebradas junto com os antigos mestres da pintura holandesa, como Johannes Vermeer e Rembrandt van Rijn.

Onde ficar em Amsterdã

Nada melhor do que De Jordaan ou De Pijp para quem busca uma boa dose de energia jovem: são as áreas mais alegres com uma infinidade de opções de bares, cafés, restaurantes, parques e lojas. As ruas do Jordaan também se gabam com outro bônus: os canais mais lindos estão lá. Embora eu normalmente não recomende se hospedar no De Wallen, conhecido como o Distrito da Luz Vermelha (Red Light District Amsterdam), tenho certeza que este bairro pode agradar visitantes aventureiros e de espírito livre.

Caso você não seja um novato e queira sentir o pulso como um morador local, Amsterdam-West não o decepcionará. Por último, mas não menos importante, os arredores do Vondelpark são simplesmente fantásticos: museus, lojas elegantes e restaurantes bancanérrimos estão todos nas suas proximidades. Ah, antes que eu me esqueça: neste link você encontra uma lista concisa dos hotéis que mais amo em Amsterdã.

Onde comer em Amsterdã

Nunca foi uma cidade cobiçada como destino gourmet. Mas tem um grande potencial de se tornar uma. Se você souber onde procurar, ficará surpreso ao ver como existem bares e restaurantes incríveis escondidos em toda cidade. Você pode encontrar um guia completo de onde comer muito bem (incluindo opções sem carne) neste link.

Onde fazer compras em Amsterdã

O varejo em Amsterdã está praticamente alinhado com o ethos holandês: um pouquinho de criatividade junto com funcionalidade e temperança. Não há espaço para excessos. É por isso que o discreto é priorizado sobre a extravagância. Esse motivo explica porque pouquíssimas marcas luxuosas instalam seus negócios aqui, cuja maioria tem lojas tão singelas em comparação com as de Paris, Londres e Nova York.

Amsterdã não exalta o cenário da moda como outras capitais. No entanto, vá até o shopping De Bijenkorf ou até a rua Pieter Cornelisz Hooftstraat se quiser se vestir com marcas sofisticadas. Do contrário, mas se autenticidade e estilo cool continuem sendo importantes para você, vale a pena observar a curadoria assertiva de lojas como Hutspot, Restored, Things I Like Things I Love, Concrete Matter e Afura.

Parques e natureza

O apelo da cidade também é concedido em parte por sua abundante natureza. Quando levamos em conta que Amsterdã não é grande e, ainda assim consegue preservar cerca de 30 parques lindos, isso já nos nos diz algo sobre como os moradores estão dispostos a cultivar uma relação próxima com o verde.

O que mais acho fascinante são as inúmeras possibilidades que nos impulsionam a ocupar estes espaços, proporcionando um grande convívio entre os cidadãos e as áreas públicas. Os parques em Amsterdã são versáteis e atendem a todos: esportistas, crianças pequenas, casais apaixonados, turma de amigos, piqueniques, autônomos com notebook, praticantes de meditação e aqueles que amam tomar sol (contanto que o astro resolva dar suas caras...).

Eventos musicais e gastronômicos também corroboram o fato de que o aproveitamento dos espaços públicos é fundamental para uma urbanização saudável. No meu favorito, o Westerpark, não só encontramos muitos cafés e restaurantes excelentes, mas algumas feiras de comida de tempos em tempos; além disso, o festival anual LGBT, Milkshake, também acontece aqui no último final de semana de julho.

A arte da culinária também é levada a sério no Frankandael, lar dos restaurantes de Kas e Merkelbach, ou da feira orgânica Puur Markt. O adorável e compacto Erasmus Park é o irmão tímido do sempre lotado, mas imperdível Vondelpark, enquanto a miríade de floresta chamada Amsterdamse Bos prova que tamanho pode, às vezes, importar: é três vezes maior que o Central Park!

Tão importante quanto, uma parada no Hortus Botanicus pode ser um momento muito bem gasto pra quem ama flora. Estabelecido originalmente em 1638 para cultivar ervas para uso medicinal, é um dos jardins botânicos mais antigos do mundo. Sua área de 3 acres conserva uma impressionante variedade de mais de 6 mil plantas (de regiões desérticas, tropicais e subtropicais), muitas das quais são espécies exóticas. Destaque: a esplêndida estufa de palmeiras!

Bovendien, welkom naar Amsterdam! Geniet ervan!