Minha querida Holanda: longe dos estereótipos
Sempre fui indagada do porquê desse amor - quase obsessivo - pela Holanda, e ainda me vejo buscando as mais diferentes explicações para algo particularmente óbvio, para mim, mas que, para muitos – senão a maioria – possa parecer nada mais que uma excentricidade.
A geografia da Holanda, convenhamos, é pouco atraente: grande parte do país vive abaixo do nível do mar e suas temperaturas são sempre tão frias que por si só já é motivo suficiente para não atrair o turismo em massa. Junto a isso creio que exista uma falsa idéia intrínseca à consciência coletiva dos viajantes que associam-na, quase sempre, a Red Light District, maconha, prostituição, bicicletas e queijos Gouda.
Poucos buscam a Holanda como um destino, tal qual se vê com França, Itália, Grécia. Se a Holanda entrou num determinado roteiro de viagem, chances são grandes de que foi para alimentar uma curiosidade sobre as "regalias" que se vê em Amsterdã, ou porque o acesso de trem numa rota Paris/Alemanha/Bélgica se tornou conveniente.
Quando visitei uma das mais antigas cidades chamada Maastricht – que faz fronteira com França e Bélgica e onde acontece a maior feira de arte e antiguidades do mundo TEFAF (Feira Europeia de Belas Artes) -, senti um misto de choque com entusiasmo ao vivenciar, sem querer, o Carnaval holandês (àquela época, buscava uma alternativa ao Carnaval no Brasil).
Ao passo em que o inverno torna inviável o desfile do semi-nu (ah, que saudade do clima tropical do meu Brasil!), a celebração toma conta da cidade inteira numa espécie de marchinha que dita o tom para blocos animadíssimos e fantasiados, cujos apreciadores etílicos circulam com copos de vidro de pub em pub sem o mínimo desarranjo. A quarta-feira de Cinzas não só cala a cidade como mostra um sistema de ordem e limpeza onde não se vê rastro qualquer de purpurina pelo chão. O holandês é orgulhoso da eficiência do seu serviço público de limpeza.
Mas nada é tão fascinante quanto a tolerância holandesa (que depois vim a descobrir que se trata mesmo é de pragmatismo e oportunismo): a mesma que pemite a sociedade conviver, com naturalidade, em meio à cena "jantar familiar com vitrines de prostituição da Red Light"; ou mesmo àquela que motivou ser o primeiro país a oficializar o casamento gay, como também a tolerância para turistas embriagados sem controle caídos aos redores dos canais.
Não existe insegurança e violência, miséria, desrespeito ao próximo, nem individualismo na comunidade. Certa vez ouvi que a Rainha Máxima Zorreguieta dá exemplos e pode ser vista de bicicleta em direção ao supermercado como qualquer cidadão, onde mora na cidade de Den Haag (Haia). Tive o privilégio de conhecê-la junto ao Rei Willem-Alexander, no dia do meu aniversário, durante as Olimpíadas do Rio de Janeiro (2016). Eu acabara de voltar ao Brasil depois de uma temporada de férias em Amsterdã, no período das festas da Gay Pride e, ao contar ao Rei sobre essa experiência, tão naturalmente ele exclamou: "É fabuloso, não é mesmo?!". Só esse comentário já diz muita coisa sobre a elegância, educação e respeito que esse casal tem para com o seu país e cidadãos.
Mas voltando a Den Haag, que fica numa região costeira linda, onde está o balneário mais pop da Holanda, a praia de Scheveningen; passeio obrigatório pelas proximidades é também no parque de Madurodam que reproduz suas cidades ícones em miniatura. Imperdível.
Organização é palavra fundamental nos Países Baixos. O holandês tem uma mentalidade pragmática e tudo em sua vida é feito ou ensinado com praticidade. Até a re-construção de Roterdã - em resposta aos bombardeios da 2a guerra - fizeram-na se tornar um marco na arquitetura. Algo único, o gigante de forma curvilínea Markthal é um espetáculo da construção moderna que combina residências com um grande mercado de alimentos frescos.
Escolha entre visitar os campos de tulipas no parque Keukenhoff; ou "bicicletar" (o verbo é conjugado no holandês) ao longo dos moinhos de vento do Kinderdijk (Patrimônio da Humanidade da UNESCO); ou vestir-se de laranja e pular de barco em barco na famosa festa Koningsdag; passear pela bela Utrecht onde estão os canais mais lindos do país; encarar a fria e distante Groningen ao norte onde existe um parque ecológico de proteção às focas; ou mesmo conhecer a energia que toma conta da inovadora e tecnológica Eindhoven... a chance de se apaixonar pela Holanda é grande.
Antes de ir, esqueça de tudo que já ouviu falar a respeito e viaje com um espírito tolerante e sem preconceitos.